Quando corto o bolo de aniversário sempre
penso na palavra “encaixe”. Todos os anos. Seja bolo de chocolate, morango ou
os dois juntos. Seja dia da semana ou não. Seja o aniversário de 7 ou 17. Seja
aqui ou nos meus sonhos.
Sempre desejei ser como os outros
Amar por inteiro
Me entregar por inteiro
Ser
Inteiro
Não ser como os outros no sentido de ser
igual. Mas ser humano exatamente como todos parecem ser. Porque acho que me
falta algo. Sinto isso. E não lá no fundo, escondido nas profundezas de quem
sou. Se sou alguma coisa. Está em mim. Impregnado. Agarrado. Tóxico. Começou
pequeno como uma pulga simpática. Mas aos poucos foi pulando para todos os
cantos, infectando tudo o que aprendi a ser. Então, agora, não me resta ser.
Não me resta nada. Porque não sei mais o que é isso.
Queria saber sentir como todos os outros.
Ver aquele brilho, tão característico, tão pessoal, tão diverso. Vejo-o o tempo
todo nos olhos alheios. Mas não quando encaro o espelho. O único brilho presente em meus olhos é uma
luz piscante. Que ao ilumina em quase nada a escuridão que posso ver. Uma luz
de dúvida. Uma luz que não queria estar lá. Eu preferiria a completa escuridão
à perturbação que essa parca luz pode me dar.
Queria ter o dom de ser eu mesmo. Ter aquela
sanidade, ainda que aparente, que estica os lábios e atraem acenos de
aprovação. Que chama a atenção para o bem, que faz os olhos brilharem com
aquele intensidade peculiar. Queria encarar a pessoa que me olha do espelho e
dizer “sou são, sou limpo, transparente”. Mas não posso. Ao contrário, deus me
deu o dom da loucura. E por sua culpa agora permaneço à deriva, sem saber a
diferença
Entre o belo e o feio
O claro e o escuro
O mim e o nada.
Agora, o que me resta? Me resta sentar e
esperar. Me resta a rebeldia. Me resta a busca pelo meu brilho nos olhos. Me
resta usar essa minha loucura
Meus versos
Livres.
Versos livres
Leves e soltos.
Para fazer deste mundo. O meu mundo. O nosso
mundo. Um lugar melhor. Um lugar real além do real imaginário. Um lugar
suportável. Amável. Mortífero. Apenas um lugar.
Me resta roer as amarras aos poucos. Me
resta desgastá-las com minha lágrimas
(elas que estão cheias deste veneno tóxico).
Me resta encarar as cordas, correntes, fitas
e laços de amores falsos. Ao invés de encarar a imagem que ri de mim no
espelho. Me resta encarar a imagem no espelho. Destruí-la moldá-la esticá-la
até que me faça bem. Bem melhor. Bem pior.
Não me resta mais nada.
Apenas sentar
E esperar.