quinta-feira, 24 de abril de 2014

Afinal, bajulação funciona?

 
 Digamos que (muito hipoteticamente) na minha classe há uma garota. Ela raramente faz os deveres, estuda para as provas apenas um dia antes e dorme em quase todas as aulas. Mesmo assim, suas notas sempre foram boas e todos os professores a adoram. E isso é natural, já que ela puxa o saco de todos eles. De forma descarada, diga-se de passagem.
   Não há dúvidas de que os bajuladores estão aí, não só nas escolas, mas nas empresas, na televisão, no cenário político, e até nas próprias famílias. E, apesar de todo o nosso desprezo por suas atitudes, também não há dúvidas de que eles geralmente se dão bem. Mas, por quê? Como funciona a bajulação e por que ela funciona?



   Em 2010, a dupla de cientistas Elaine Chan e Jaideep Sengupta publicou um estudo intitulado Insincere Flattery Actually Works. Os autores são cautelosos ao afirmar que puxar o saco funciona, mas é nessa direção que sua pesquisa aponta. Elaine e Sengupta criaram situações nas quais os pesquisados foram expostos à bajulação insincera e oportunista. Numa delas, distribuíram um folder entre os pesquisados que detalhava o lançamento de uma nova rede de lojas. O material publicitário elogiava o “apurado senso estético” do consumidor. Apesar do evidente puxa-saquismo, o sentimento posterior das pessoas foi de simpatia em relação à rede. Entre os participantes, a medição da atividade cerebral no córtex pré-frontal (responsável pelo registro de satisfação) indicou um aumento de estímulos nessa região. O mesmo ocorreu em todas as situações envolvendo elogios.
   Segundo os pesquisadores, a bajulação funciona devido a um fenômeno cerebral conhecido como “comportamento de atraso”. A primeira reação ao elogio insincero é de rejeição e desconsideração. Apesar disso, a bajulação fica registrada, cria raízes e se estabelece no cérebro humano. A partir daí, passa a pesar subjetivamente no julgamento do elogiado, que tende, com o tempo, a formar uma imagem mais positiva do bajulador. Isso vale desde a agência de propaganda até o funcionário que leva um cafezinho para o chefe. “A suscetibilidade à bajulação nasce do arraigado desejo do ser humano de se sentir bem consigo mesmo”, diz Elaine Chan. A obviedade e o descaramento do elogio falso, paradoxalmente, conferem-lhe maior força. Segundo os pesquisadores, é a rapidez com que descartamos os elogios manipuladores que faz com que eles passem sem filtro pelo cérebro e assim se estabeleçam de forma mais duradoura.
 
 Segundo Elaine e Sengupta, outro fator contribui para a bajulação. É o “efeito acima da média”. Temos a tendência de nos achar um pouco melhor do que realmente somos, pelo menos em algum aspecto. Pesquisas com motoristas comprovam: se fôssemos nos fiar na autoimagem ao volante, não haveria barbeiros. Isso vale até para a pessoa com baixa autoestima. Em alguma coisa, ela vai se achar boa, nem que seja em bater figurinha.
   A bajulação também pode ser eficaz no relacionamento com os colegas. É o que sugere uma pesquisa divulgada na revista médica americana Journal of Basic and Applied Social Psychology que mostra que uma pessoa tende a ser mais receptiva a um pedido de favor logo depois de ter sido elogiada por um vizinho de baia. De acordo com os estudiosos, as respostas positivas aumentam de 50% numa situação normal para 79% após uma bajulação. 
   No final, é claro, tudo é fruto da vaidade e ambição humanas. Afinal, todos nós gostamos de receber um elogio de vez em quando (e nem sequer nos atentamos para sua sinceridade ou mão), e também todos queremos ter o nosso lugar ao sol com o menor esforço possível, ou usando uma habilidade natural que não demande de tanto trabalho (como é o ato de bajular).
   E se você quiser ficar livre dos cães bajuladores? Segundo Elaine Chan, só com uma autoestima de ferro (o que está difícil hoje em dia).
"Os aduladores são como as plantas parasitas que abraçam o tronco e ramos de uma árvore para melhor a aproveitar e consumir." - Marquês de Maricá



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